sábado, 24 de março de 2012

Judit Polgár também faz xixi


A melhor enxadrista de todos os tempos esteve no Brasil
A GRANDE MESTRE JUDIT POLGÁR já foi embora do Brasil, mas sua passagem por aqui deixou algumas marcas que custarão a sanar, pelo menos na mente reflexiva deste capivara que vos escreve. Para minha sorte, ainda bem que será assim.

Com humildade e carisma, a mais forte jogadora de xadrez de todos os tempos mostrou que mesmo mitológicos top-players não são máquinas frias e impecáveis, apesar de todas as peripécias que são capazes de realizar nos tabuleiros. Em sua curta e marcante passagem pelo Brasil, Judit Polgár deixou uma impressão certeira: a de que é humana.

É preciso comentar isso, por mais que pareça óbvio, porque muitos bons jogadores têm se distanciado do público em geral, por aversão, arrogância ou qualquer outro motivo débil, fazendo a capivarada pensar que os ídolos são de cera. 

A postura de Polgár, nos dias que esteve em Caxias do Sul-RS, disputando a Festa da Uva 2012, derruba a falsa modéstia de um turbilhão de top-GMs por aí, bem menos famosos do que ela, mas que insistem em negar a proximidade e o carinho que o público tanto almeja.

Nesses quase três anos de Rádio Xadrez, tive a oportunidade de conhecer alguns famosos jogadores lá de fora: Garry Kasparov, Vassily Ivanchuk, Natalia Pogonina e toda a nata do Grand Slam de Xadrez de São Paulo (Carlsen, Aronian, Nakamura etc.). Também troquei mensagens com alguns outros tops e posso garantir que nenhum deles, por mais simpático e cordial que tenham sido, demonstrou ser tão “gente” quanto Polgár foi neste torneio.

Vejamos os porquês:


Ela chegou cansada após 26 horas de viagem (Budapeste, Amsterdã, São Paulo, Porto Alegre e Caxias) e não disfarçou isso com mau humor ou recolhimento, pelo contrário, andou no meio da turba com os olhos inchados e o rosto amassado, sorrindo sempre que podia sorrir, calando quando podia calar. 

Ela jogou o seu melhor e, mesmo assim, escapou por pouco de algumas derrotas, mas, então, não culpou a variante, o adversário, a organização ou as condições de jogo: culpou a si mesma e as “besteiras” que fez no tabuleiro, como quando empatou com o brasileiro MF Alfeu Bueno e confessou mais tarde: “Mereci! Eu estava ganha e fiz duas capivaradas horríveis”.

Ela comprou sapatos. Ela tirou os sapatos. Ela passeou no shopping olhando vitrines e escolhendo bolsas e ficou encantada com uma criança, com um ônibus gigante, com a dança e a música brasileira.

Escolhendo os sapatos...
... tirando os sapatos
Ela comeu pizza e riu muito de tudo que parecia estranho para ela - como um fã ter pedido que ela autografasse o passaporte dele -, sem se importar se estavam mirando-a o tempo todo ou se iam dizer que suas gordurinhas localizadas saltavam à vista.

Ela reclamou de acordar cedo para a rodada (7h30), tomou o café da manhã lentamente, sem esconder a preguiça – apesar de atender com simpatia meu pedido para foto – e ficou farta de xadrez ao final de um longo dia: “as peças estão embaçando na frente dos meus olhos”, comentou.

Ela não largou seu iPad, atualizando Twitter e Facebook sempre que pôde e mantendo-se online em sua conta de bate-papo do G-mail, por onde falava com a família, especialmente com o marido.

Ela mostrou que gosta de xadrez, sem tentar disfarçar isso nenhum pouco, misturando-se à plateia, mesmo que discretamente, para assistir aos combates emocionantes de Armageddon entre Milos e Mareco, Flores e Roselli.

Judit dá autógrafo em passaporte de fã
Ela tirou fotos, muitas fotos, e desceu do palco de jogo, atravessando todo o salão, para fazer xixi no banheiro coletivo. Como qualquer pessoa faz quando está jogando e tem vontade de fazer xixi. Não se assustem, leitores um pouco mais engomados. Sim, é verdade, eu vi: Judit Polgár também faz xixi durante a partida.

Por tudo isso, a húngara saiu do Olimpo dos semideuses e provou ser tão gente como nós. Ela leva o meu voto de gênio do xadrez mundial mais humano que o Brasil já viu passar em suas pelejas enxadrísticas. Eu espero, com sinceridade, que existam mais como ela.

Por: Tiago A. dos Santos

***

MEMORÁVEL

Abaixo, algumas fotos que Leandro Salles e eu tiramos durante a competição. Também há imagens do Facebook da própria Judit Polgár.

Foram dois dias intensos para nós também, que saímos de nossas casas (Curitiba e São Paulo, respectivamente), voamos até Porto Alegre, viajamos à noite pelas sinuosas estradas gaúchas e fizemos uma maratona homérica para encontrar um hotel disponível em Caxias. 

Mas não poderia ter sido melhor: a cordialidade do povo do Sul, o reencontro com amigos de todo o Brasil, a hospitalidade e simpatia de André Boff e toda sua equipe e, por último mas não menos importante, ter encontrado Judit Polgár no café da manhã do hotel foram momentos suficientes para fazer tudo ser inesquecível. 

Que venha a Festa da Uva 2014!

Um encontro histórico no café da manhã do hotel
"Desencana Judit! É difícil mesmo ganhar do Alfeu!"
A tigresa escolhe sapatos no Shopping Iguatemi Caxias
E posa para fotos com vendedoras da loja
Judit com os personagens do Síto do Pica-pau Amarelo
Com nosso amigo Albert Silver (centro), editor do ChessBase
Virgolino, da Paraíba, batizou a filha de "Judit Polgár"
GM Everaldo Matsuura (à esquerda) prestigiou o evento
GM Jose Cubas, do Paraguai, quase derrotou Polgár
GM Andrés Rodriguez, do Uruguai 
GM Diego Flores, da Argentina
GM Gilberto Milos (esquerda), o campeão, e seu olhar matador 
À direita, o GM Giovanni Vescovi
Polgár com sono matinal jogando com as peças de Mecking
Clássico brasileiro: Milos e Mequinho

GM Felipe El Debs, do Brasil
MI Robert Hungaski, dos Estados Unidos
MI Bernardo Roselli, do Uruguai
Henrique "A lenda" Mecking 
GM Sandro Mareco e Milos aguardam início do Armagedon

3 comentários:

Alberto disse...

Wow, deve ter sido uma experiência e tanto mesmo ter contato com esta incrível personagem do xadrez! E como você nos mostra aqui, é bom ver como a melhor jogadora na história do xadrez feminino consegue manter tanta simplicidade e modéstia; isto mostra como ela é especial dentro e fora de nosso jogo.

Depois deste post vamos esperar que ninguém mais venha perguntar como ela sabe o seu nome, ein Tiago! rsrs

Um abraço e parabéns por tudo aí.

Álvaro Frota disse...

Grande Tiago:

É como naquele videozinho do Cebolinha que meu neto viu comigo outro dia no YouTube: a moça faz cocô mas ocorre que o cheiro é de rosas!

Aquele abraço!

(comentário enviado por e-mail)

Anônimo disse...

Tiago,

bem chamativo e provocativo o titulo do post.

acho que se nao fosse o titulo eu nao iria ler tudo! (risos)

Bom, levando o assunto da postura dos Tops, acho que alem de serem de outro país, outra cultura, deve ser raro esta postura como da Judit.
Acho que jogadores estrelas do xadrez, estou dizendo daqueles que nasceu com o "dom", ou para ser entendido aqui, vou usar o termo super dotado mesmo. Sao super dotados.

Acho que o fato deles nao serem sociais talves deve ser por causa do "meio" no qual vivem.
Ou por "eles" serem o que sao. É o jeito deles e pronto. Por serem a minoria, todo mundo nota. As atitudes, o jeito deles sao diferentes da maioria e da massa. Digo da maioria pra referir aqueles que entendem isso e respeitam. E digo massa, pra referir aqueles que alem de perceber isso, nao entendem e falam besteiras.

Bao, Tiago, fica claro que nao estou dizendo que voce é da massa.

É isso ai.
Abraços de um outro capivara.

Lances Finos